top of page
  • Foto do escritorLidice Meyer

Missões: um legado feminino


Quando pensamos em missionários, frequentemente nos vêem à mente figuras como Livingstone ou Simonton, mas é interessante lembrar que a primeira vocação missionária na Bíblia foi atendida por uma mulher anônima: a samaritana. No livro dos Atos dos Apóstolos vemos que estes sempre tiveram a ajuda de mulheres na evangelização e na manutenção das igrejas formadas. Esta é ainda a mesma realidade no campo missionário cristão de hoje. As mulheres, solteiras ou casadas, representam a grande maioria deste time em campo. Mas a aceitação das mulheres no campo missionário só ocorreu após o século XIX, embora tenha sido também delas a maior parte das iniciativas na criação de instituições de apoio ao trabalho missionário desde o século XVIII.

Até então, as mulheres no campo missionário eram vistas como apenas esposas dos missionários sem nenhuma atuação no campo evangelístico. Muitas destas faleciam precocemente e por isso eram tidas como frágeis e mais suscetíveis às doenças causadas pela falta de saneamento. A grande responsável pela mudança desta visão foi Ann Hasseltine Judson (1789-1826). Numa época em que não era dado à mulher transpor os limites da esfera doméstica, Ann desenvolveu um ministério próprio paralelo ao de seu marido, o missionário Adoniram Judson. Ela mostrou que não era uma mera esposa de missionário e sim uma missionária e esposa. Em seu diário registrou: “Sou uma criatura de Deus, e Ele tem o direito indiscutível de fazer comigo como parece bem aos seus olhos. Alegro-me por estar em suas mãos - por Ele estar presente em todos os lugares e poder me proteger em um lugar ou em outro. . . quer eu passe meus dias na Índia ou na América, desejo passá-los a serviço de Deus e estar preparada para passar a eternidade em sua presença.”

Ann trabalhou com o marido na Índia e na Birmânia (atual Mianmar). Escreveu livros sobre o trabalho missionário e sobre aspectos culturais da Birmânia. Foi autora de um catecismo em birmanês além de traduzir os livros de Daniel e Jonas para esta mesma língua e o evangelho de Mateus para o Tailandês. Seu esposo a encarregou especialmente da evangelização das mulheres, algo impensável na época em seu país de origem. Ann também criou e manteve uma escola e manifestou-se ativamente contra a prisão do marido na guerra Anglo-Birmanesa, protestando à porta da prisão por meses. Faleceu precocemente de varíola aos 37 anos mas seus escritos despertaram em muitos o interesse por missões.

Pouco tempo depois as missionárias solteiras eram não só aceitas como também desejáveis às juntas de missões pela sua facilidade no trato com mulheres e crianças e sua atuação no ensino e na área de saúde. Em 1909 havia 4.710 mulheres solteiras no campo missionários e desde então este número só cresceu. Entre casadas e solteiras, as mulheres permanecem sendo a principal mão de obra de Deus para a evangelização, seja no mundo urbano ou rural. O crescimento do Reino de Deus desde os primórdios do cristianismo deve muito à sua atuação e dedicação em meio às dificuldades físicas, sociais e econômicas. Se seus nomes são desconhecidos de muitos, como o da samaritana, eles estão com certeza escritos com tinta indelével no Livro da Vida.


Lidice Meyer Pinto Ribeiro Doutora em Antropologia, Professora na Universidade Lusófona em Lisboa, Portugal

110 visualizações1 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page